sexta-feira, 2 de novembro de 2012

UMA AMOR DE OLHARES




                O ônibus lento trafegava as ruas do centro histórico e avançava pela rua das Cajazeiras, Alberto se distraia vendo as fachadas das casas e embora elas estivessem ali desde a sua infância é com surpresa que ele constata, sempre toda vez que passa, que as cores, as portas, as grades, os letreiros e placas, as fotos rasgadas dos políticos em campanha, um detalhe, outro, que elas, as casas, estão sempre mudando e a paisagem nunca é a mesma.
 Pegara o ônibus no terminal rodoviário e nem percebeu que alguém sentara ao seu lado até sentir o macio de uma pele tocando-lhe o braço, natural para quem anda de coletivo, mas a calça jeans a blusa rosa cobriam um corpo de uma mulher jovem e cheinha, olhou-a, quis ver-lhe o rosto, quando a olhou ela olhou-o, o rosto arredondado, as sobrancelhas espessas e afiladas, por um segundo, dois, contemplaram-se; imediatamente desolham-se, a etiqueta urbana é que os olhares sejam rápidos, que não pareçam inquiridores nem desrespeitosos, mesmo assim a pele do braço dela permanecia encostada ao dele, a calça tinha detalhes prateados e ela carregava uma bolsa rosa, esmalte nas unhas e sandálias, tudo rosa. Indiferente o ônibus passara por Monte Castelo, numa sincronia não combinada os dois olham-se ao mesmo tempo, um pouco mais demorado, com certeza ela contempla a esfinge do poeta e ele aquele enigmático olhar de cinco ou dez segundos, será se estou indiscreto pensou o poeta e recolheu-se à vista da avenida dos Franceses, olharam-se novamente, coincidências, coisas da vida. Depois da ponte do rio Anil ela pediu parada. Olharam-se. Pela primeira vez o poeta pensou: ela gostou de mim, enquanto isso já se levantava com dois companheiros de viagem e descia, ele acompanhou-lhe os passos se distanciando, ela olhou pra trás, ele pela janela a olhava, tinha certeza ela gostara dele, o ônibus arranca lentamente passa por ela, os dois fixam o olhar enquanto se distanciam...

Um comentário:

  1. A vida é cheia de "impressões", feliz quem tem a sensibilidade de vê-las... senti-las...

    Quem vive além da realidade suas entrelinhas é capaz de pintar aprazível quadro de sentimentos apenas com a tinta oferecida por um olhar...

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