Quando
ia chegando Zé de Xangô disse, tem duas entidades lá dentro Exú e Pomba Gira,
Alberto sorriu cúmplice, logo ele que entende tudo como representação, forma de
explicar realidades, comportamentos; duas entidades? é, vamos ver. Prudente, Zé
de Xangô ficou na porta.
No fundo da casa, onde está o belo
altar de São Benedito cuidado pelas coreiras que lhe trocam as toalhas, renovam
as velas, colocam adereços o Exú toca um tambor e entoa um ponto de mina
enquanto Pomba Gira veste um longo vestido vermelho, está deitada no chão e
curte uma visível embriaguez.
Romão entoa os cantos e ouve as
conversas dela uma loura, olhos azuis quase louça, vidro. Ao avistar a silhueta
de Alberto se levanta de maneira descuidada e mostra a calcinha branca que
neste momento não tem nada de erótico e eis uma Pomba Gira eslava que conversa
com graça e sotaque carregado, olhe desculpa eu estar assim e semicerra os
olhos, sou míope, estava bebendo, perdi os óculos e comprimia mais as pálpebras
enquanto aproximava o rosto acentuando-lhe a beleza e as marcas de uma mulher
de 50 anos, Ivetsa, muito prazer, arregala os olhos perscrutadores e numa
conversa que recorda momentos vividos, graça, beleza retira de uma pasta um
book e mostra fotografias, olha esta, este aqui do meu lado é o ministro do
Japão, esta é Nova York uma recepção essa aqui sou eu, tá vendo essa? é Minas,
morei 16 anos lá, como era bom e de supetão pôs-se a chorar mansamente, um
minuto, limpou os olhos, desculpe é o amor, eu sofro, sabe o Baby Boy? ele tá
aí? pois é fico com ele, quem não
ficaria brincou o poeta, ah! tu eu não quero és um homem muito charmoso, não
quero amor e o choro volta, saí pra procurar um emprego, sou interprete falo
inglês, alemão, húngaro, já viste alguém que fala húngaro e charmosamente
tocava os cabelos acentuando-lhe a graça, falo francês, italiano, espanhol e
português ninguém quer me contratar, não é isso não, eu não quero trabalhar, eu
sofro e retoma o choro. Sabe meu filho
Peter amigo do Baby Boy? nasceu lá, hummm era bom, ouvia o the doors, muito
rock, rolling stones, led zeplling, pink floyd, um dia em Nova York, o Peter
pequenino, na mesa umas bolotas de pó a gente cheirava, eu o pai dele e uns
amigos e ouvíamos rock, muito rock, o rosto meditativo, olhos fechados, sereno,
a recordar-se, abre os olhos e retoma o choro manso, quase um fingimento. Olha
para o Exú, ele pensa que eu sou Pomba Gira, e tu também pensa? e ri-se íntima,
não acredito, uhhh... não acredito. tchau....gostei muito de conversar com
você, posso voltar? sim,claro, você sabe pra que lado foi o Baby Boy?